terça-feira, 11 de maio de 2010

Criacionismo filosófico

Após a Revolução Intelectual ocorrida em virtude das Cruzadas e frequentemente chamada de “Renascimento Cultural”, houve um resgate da cultura greco-romana por parte da recém-formada burguesia. Esse resgate levou a um questionamento dos paradigmas católicos em vigência, no fim da Idade Média. Esses questionamentos racionais legitimaram uma postura empirista e racionalista mediante a fé – então manipulada na mente das pessoas pela própria Igreja. Começava, oficialmente, no mundo moderno, a separação entre ciência e religião. O pensamento racionalista de cunho grego passou a ser utilizado insistentemente como método para desconstruir o pensamento judaico-cristão. É importante salientar que o mau uso da Bíblia – e por que não dizer da fé – por parte da Igreja e do clero ao longo da História não deve servir de amparo a uma análise científica para rejeitar o cristianismo, como tem ocorrido desde então.

A própria Igreja Católica se apropriou, com fins teológicos particulares, do pensamento grego, como podemos observar em Agostinho de Hipona (Santo Agostinho) e Tomás de Aquino. Mas podemos tratar desse tema posteriormente. Em nosso entendimento, analisar a Bíblia e seu texto requer compreensão do pensamento hebraico. Ao invés de propormos apenas uma perspectiva de análise do relato, ao olharmos para o pensamento hebraico, uma nova perspectiva se abre ante nossos olhos. Julgar a cultura hebraica a partir da filosofia grega não só é empiricamente incorreto como também perigoso.

Assim, a fim de lançar alguma luz sobre o tema da criação a partir da perspectiva hebraica, é preciso nos livrar de nossos pressupostos gregos, o que admitimos ser difícil, na medida em que somos doutrinados desde crianças a pensar de maneira grega.

Para uma rápida comparação entre os pensamentos grego e hebraico, gostaríamos de expor rapidamente a dialética entre ambas a partir de dois temas: o debate entre fé e razão e a essência. Para os gregos, a fé foi ultrapassada quando os mitos deixaram de explicar aquilo que os rodeava. Assim, passaram a buscar, de maneira crescente, explicações puramente racionais para suas inquietações. A fé foi substituída pela razão, pois esta era capaz de responder o que aquela não poderia mais. No conceito hebraico, entretanto, fé e razão não se separam. No conceito hebraico, a fé é produto das evidências dadas pela razão. Deus está completamente ligado à ciência porque Ele é a ciência viva, o Criador. No pensamento hebraico, o ser humano é limitado, e é por isso que Deus precisa Se revelar de maneira limitada, para que o ser humano possa compreender que Ele existe. Enquanto os gregos esperavam poder comprovar e apalpar, os judeus não precisam da materialização do objeto, mas apenas evidências de sua existência. Como exemplo, gostaria de citar o episódio em que Moisés pede que Deus Se revele a Ele. Quando Deus o faz, imediatamente Moisés descreve a Deus, mas não de maneira física como se suporia no pensamento grego, mas o caráter de Deus passa a ser descrito (cf. Êxodo 33:18-34:7).

No que diz respeito à essência, essa talvez seja uma das mais velhas discussões da Filosofia. No pensamento grego, há inúmeras respostas sobre o que viria a ser essência, a fim de descobrir o que de fato as coisas são. Platão sugeriu que a essência do homem fosse sua alma. Aristóteles defendeu que a essência do homem são seus pensamentos. Entretanto, como na raiz do pensamento hebraico alma e corpo são a mesma coisa e os pensamentos têm uma origem material (seja coração, para o contexto Bíblico, ou cérebro, para o mundo moderno), a essência do homem seria seu caráter, por conseguinte, refletido em suas ações.

De que forma isso está relacionado ao criacionismo? O criacionismo concebe a existência de Deus, concebe o ser humano voluntariamente subjugado à vontade desse Deus e O respeita, como o pensamento hebraico pressupõe. Assim, quando Moisés descreve a Criação, como reprodutor do pensamento hebraico, ele descreve o que viu (revelação) e sentiu. A fé está profundamente arraigada no pensamento hebraico bíblico, mas não para substituir a razão, e sim como parte integrante dela. Não defendemos o fim da análise científica, mas sim a análise do discurso e do pensamento hebraicos como elementos culturalmente racionais. Assim, filosoficamente, criacionismo é científico sem abdicar da fé. Qualquer questionamento grego sobre a perspectiva hebraica da Criação seria, assim, inválida.

(Rodrigo Udo Zeviani, mestre em História pela Universidade Estadual de Maringá, leciona Filosofia há cerca cinco anos. Também é professor do curso de Pedagogia no Centro Universitário de Maringá, Cesumar)

Um comentário:

Elyson Scafati disse...

O autor do texto vê a situação sob um prisma cristão. Todavia, não entende nada de judaísmo.

Há 2 formas de judaísmo:

- Uma é para o povão, ou seja, é o entendimento quase que literal do Tanach. É o controle social.

- A outra é para aqueles que se iniciam de fato na crença a fim de se tornarem sacerdotes. É o aprendizado.

O que nos interessa é a segunda forma. As passagens bíblicas jamais devem ser entendidas em sua literalidade, mas na mensagem que deixam.

Por exemplo, o ato da criação faz parte de um pensamento de forma linear, pois a forma de pensar para semitas é linear. Nada mais é que um mito que explicava como tudo surgiu em uma época cujo conhecimento era praticamente nada.

Diferentemente de uma cultura grega cuja origem é indo-européia, onde o pensamento se desenvolve de modo cíclico.

São sistemas distintos e assim, ao fundir os dois o cristianismo pecou, oma vez que tentou conferir lógica ao ilógico.

A criação do homem é uma lição para os pais: o homem nasce ingênuo e puro e é aos pucos educado.

Ao crescer, tem de provar da árvore do conhecimento, ou seja aprender.

Após deverá ter sua mulher (a costela na cultura do oriente médio significa que a mulher é submissa ao homem), formar sua família e caminhar com as próprias pernas.

"Criacionismo é filosoficamente científico, porém sem abdicar da fé."

Concordo com o segundo ponto mas discordo do primeiro. A filosofia não se trata de teologia a qual nasceu da filosofia assim como as ciências em geral.

Usar argumento filosófico como se fosse cientificamente correto é uma atitude completamente equivocada.
Vc acaba por cair na erística (arte ou técnica da disputa argumentativa no debate filosófico, empregada com o objetivo de vencer uma discussão e não necessariamente de descobrir a sua verdade).

É o que Lane Craig mais faz em seus debates e o que Plantinga apresenta em suas teses.

Assim, há que se tomar muito cuidado ao confundir o que é filosoficamente defensável com aquilo que é cientificamente evidenciável, quesito onde o criacionismo e sua versão requentada, o DI, deixam a desejar.

Agora a pergunta qual a marca de criacionismo que é a verdadeira? Qual as evidências para tal afirmativa?

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